segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

DE A FOLHA DE S. PAULO: MORRE MOACYR SCLIAR

Morre aos 73 anos o escritor gaúcho Moacyr Scliar

GRACILIANO ROCHA
DE PORTO ALEGRE 

Morreu neste domingo (27) o escritor e colunista da Folha Moacyr Scliar, 73. A morte ocorreu à 1h. Segundo o Hospital das Clínicas de Porto Alegre, onde ele estava internado, Scliar teve falência múltipla dos órgãos. 


O velório acontece hoje na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, a partir das 14h. De acordo com nota oficial da Academia Brasileira de Letras, o enterro acontecerá na segunda (28), às 11h, no Cemitério Israelita de Porto Alegre. 
O escritor sofreu um AVC (acidente vascular cerebral) isquêmico no dia 16 de janeiro. Ele já estava internado para a retirada de pólipos (tumores benignos) no intestino. 
Logo depois do AVC, o escritor foi submetido a uma cirurgia para extirpar o coágulo que se formou na cabeça. Depois da cirurgia, ele ficou inconsciente no centro de terapia intensiva.
O quadro chegou a evoluir para a retirada da sedação, mas no dia 9 de fevereiro o paciente foi abatido por uma infecção respiratória e teve de voltar a ser sedado e à respiração por aparelhos.
Por causa da idade, os médicos evitaram fazer prognósticos sobre a recuperação do escritor.
 
CARREIRA

Nascido em Porto Alegre e formado em medicina, o escritor e colunista da Folha publicou mais de 70 livros entre diversos gêneros literários: romance, crônica, conto, literatura infantil e ensaio.
Scliar ganhou diversos prêmios Jabuti. Em 2009, o romance "Manual da Paixão Solitária" foi eleito livro do ano. Ele também emplacou dois na categoria romance, "Sonhos Tropicais" (1993) e "A Mulher que Escreveu a Bíblia" (2000), e um na categoria contos, "O Olho Enigmático" (1988). Em 1980, ele venceu o prêmio de literatura da APCA por "O Centauro no Jardim".
Seus livros frequentemente abordam a imigração judaica no Brasil, mas também tratam de temas como o socialismo, a medicina e a vida da classe média. A obra de Scliar já foi traduzida para doze idiomas.
Dois deles, "Um Sonho no Caroço do Abacate" e "Sonhos Tropicais", ganharam adaptação para o cinema. 

Scliar consolidou a temática judaica na literatura brasileira

MICHEL LAUB
ESPECIAL PARA A FOLHA

É sempre difícil falar da obra de um escritor tão prolífico quanto Moacyr Scliar.
Da estréia com "O Carnaval dos Animais (1968) até o elogiado "Eu Vos Abraço Milhões" (2010), foram algo como 70 livros entre romances, coletâneas de contos, crônicas, ensaios e infanto-juvenis. Um conjunto heterogêneo, naturalmente, tanto nos temas e na forma quanto no resultado --que, em seus melhores momentos, teve registros que iam do fantástico/mítico em "O Centauro no Jardim" (1980) ao realismo histórico de "A Majestade do Xingu" (1997).
Os manuais e enciclopédias do futuro devem creditar a ele, na esteira do pioneirismo de Samuel Rawet (1929-1984), a consolidação da temática judaica na literatura brasileira. Mais amplamente, das questões que envolvem imigrantes na sociedade moderna do país.
Nos anos 70, quando Scliar se firmou na geração que tinha João Antonio, Ignácio de Loyola Brandão, Ivan Angelo e outros tantos nomes menos ou mais engajados, os sentimentos característicos desse tipo de personagem --sua estranheza e ambiguidade diante de uma realidade muitas vezes hostil-- de alguma forma ganharam ressonâncias políticas condizentes com o espírito da época.
Mas o traço que mais define o autor talvez seja o de contador de histórias. Influenciado por tradições ancestrais como a narrativa oral e a parábola bíblica, poucas vezes ele se colocou acima de seus enredos, tanto em termos de estilo quanto de uma suposta sofisticação psicológica.
Para muitos que o conheceram ou trabalharam com ele --amigos, colegas, as dezenas de jovens escritores para quem ele escreveu prefácios, os editores de jornais e revistas que ele salvou de inúmeras emergências em prazos exíguos--, era como se esse procedimento literário, que transpirava interesse pelos pequenos dramas e comédias humanos, fazendo com que isso chegasse ao leitor da maneira mais despojada e saborosa possível, reproduzisse um traço pessoal seu: a generosidade.


 

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