Ao protocolar discursos, Serra assume ser candidato sem projeto
A campanha de Dilma Rousseff (PT) jogou um balde de água fria em setores da esquerda ao trocar seu programa inicial protocolado no TSE por uma versão “amenizada” (leia mais aqui). Mas a campanha de José Serra (PSDB) fez coisa muito pior. Às pressas, compilaram dois discursos do presidenciável tucano e protocolaram como se fosse o plano de governo do candidato. Com o gesto, confirmaram, na prática, o que os analistas vem apontando a tempos: a oposição de direita não tem um projeto para o Brasil.
O documento de 13 páginas traz a íntegra dos discursos feitos por Serra no encontro nacional do PSDB, DEM e PPS, realizado no dia 10 de abril, em Brasília (DF), e na convenção nacional do partido, em Salvador (BA), no dia 12 de junho. De acordo com o PSDB, o documento atende aos requisitos definidos pelo TSE, que pede que o programa básico da campanha esteja anexado aos documentos de registro.
Nos discursos, Serra formula pouquíssimas propostas concretas. A maior parte de suas falas dedicam-se à análise de conjuntura. Serra ataca o governo federal, fala de suas origens, e compara, veladamente, o presidente Lula ao rei francês Luís 14, cujo lema era “o Estado sou eu”.
A coordenação da campanha de Serra não deu nenhuma explicação à imprensa sobre o motivo de ter protocolado os discursos como sendo as diretrizes do plano de governo.
O advogado do PSDB Ricardo Penteado, por sua vez, nega que tenha havido falta de tempo para elaborar um documento específico. “Chegou-se à conclusão de que os discursos já continham essas diretrizes”, disse.
As poucas propostas concretas do programa são vagas. O candidato tucano, por exemplo, promete “acabar com a “miséria absoluta” no país” e criar mais de 1 milhão de vagas em escolas técnicas. No discurso, o tucano também citou a necessidade de ter “prioridades claras”.
Uum capítulo inteiro do documento é dedicado ao desenvolvimento sustentável, no qual destaca apenas a necessidade de aumentar a qualificação da mão de obra e defende genericamente a “sustentabilidade ambiental”.
Nos discursos entregues ao TSE como representativos das propostas de Serra, outro aspecto se destaca. Predominam palavras como “povo”, “brasileiros” e “Brasil”, o que mostra uma tentativa de Serra de tornar sua linguagem mais simples e mais atraente para camadas populares.
Uma série de promessas feitas por ele durante a pré-campanha -como a criação dos ministérios da Segurança Pública e das pessoas com deficiência- não são citadas nos discursos, porém.
A ideia do PSDB é recolher propostas pela internet ao longo da campanha. Para isso, foi criado um site para receber a contribuição dos eleitores. As propostas encaminhadas são filtradas pela equipe de elaboração do programa de governo. O resultado dessa consulta vai descambar no “projeto” de Brasil que a oposição de direita tem a oferecer à sociedade brasileira.
Carta
Serra assina hoje uma carta social para reafirmar o compromisso da campanha tucana com projetos e princípios sociais. A principal intenção é afastar as afirmações de que, se eleito, Serra acabaria com o programa Bolsa Família. O texto foi elaborado por secretários estaduais e municipais de assistência social de partidos aliados à chapa tucana. O documento propõe um “recorte temporal que localize o nascedouro dos programas, projetos e serviços socioassistenciais do Sistema Único de Assistência Social de nosso país”. Os secretários reafirmam que programas como o de erradicação do trabalho infantil, os Centros de Referência de Assistência Social e até o Bolsa Família têm semente plantada durante o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso.
A estratégia do ex-governador de São Paulo é muito semelhante à utilizada pelo presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. Na primeira eleição em que conseguiu alcançar a Presidência, Lula editou uma carta aos brasileiros para tentar contornar o temor do mercado financeiro quanto a um possível governo petista. No texto, o então candidato afirmava que uma transição para o que a sociedade brasileira reivindicava deveria ser lenta e compartilhada, sem decisões unilaterais. Lula ainda afirmou que manteria os acordos financeiros internacionais assinados pelo país: “Premissa dessa transição será naturalmente o respeito aos contratos e obrigações do país. As recentes turbulências do mercado financeiro devem ser compreendidas nesse contexto de fragilidade do atual modelo e de clamor popular pela sua superação”, escreveu Lula.
A diferença entre a carta de Serra e a de Lula não está apenas no tema de cada uma, mas no histórico de descumprimento de palavra do candidato tucano. Quando foi eeleito prefeito de São Paulo, em 2004, Serra assinou e protocolou no cartório um documento garantindo que cumpriria o mandato de prefeito até o final. Mas dois anos depois rasgou a promessa e deixou a administração municipal para candidatar-se ao governo do Estado.
Seus principais aliados e até o presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra, já deram declarações e apresentaram propostas no Congresso contra as políticas e os programas sociais do governo Lula. Com estes precedentes, é difícil saber se a “carta” assinada por Serra será levada a sério pelo eleitorado.
Da redação,
com agências
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