sábado, 26 de setembro de 2009

MAIS UMA VEZ, SOBRE A ORAÇÃO

O que é a oração? Em seu nível mais simples, orar é se comunicar, estabelecer um vínculo com uma divindade, uma vez que os fiéis de todas as religiões existentes no mundo oram.

A oração pode ser individual ou coletiva. Pode ser feita por uma pessoa, em seu quarto, com a porta trancada, como recomendava Jesus; ou pode ser feita em uma comunidade de fé.

A oração pode adquirir várias formas: louvor e adoração a Deus (ou às divindades), súplica ou petição, quando apresentamos a Deus uma de nossas necessidades e rogamos para que seja atendida, ou ainda, pode ser em forma de um lamento, expressando nossa angústia, como a oração da mãe de Samuel, retratada no primeiro livro do profeta.

A oração no Novo Testamento

No relato neotestamentário, temos várias recomendações de Jesus quanto à oração. Os comentários que seguem são sobre os textos mais explícitos sobre o tema, que permeiam todos os evangelhos, de ponta a ponta.

Em Mateus, na porção identificada com o Sermão da Montanha, no capítulo VI, versículos 5 a 15, Jesus recomenda a oração privativa, em oposição à oração pública, mas permeada de hipocrisia. Alem disso, Jesus recomenda a confiança em Deus, "porque o seu Pai sabe do que precisam, antes mesmo de o pedirem".

Em seguida, ele apresenta uma versão da Oração do Pai-Nosso.

No Evangelho de Lucas, o ensino de Jesus sobre a oração está registrado no capítulo XI, versículos 1 ao 13. Neste trecho, além de sermos apresentados a uma versão simplificada do Pai-Nosso (é preciso lembrar-se que os evangelhos foram escritos em um período histórico posterior à vida de Jesus e, portanto, são transcrições da tradição oral cristã da igreja primitiva), temos os incríveis versículos 9 e 10: "Por isso lhes digo: peçam e lhes será dado; busquem e encontrarão; batam, e aporta lhes será aberta. Pois todo o que pede, recebe; o que busca, encontra, e àquele que bate, a porta será aberta"

Em João, no capítulo 17, temos o registro de uma oração de Jesus, que, entretanto, pode ser dividida  em duas seções: a primeira, por si mesmo; (versículos 1 ao 5) a segunda, por seus discípulos (versículos 6 ao 26).


1   Depois de dizer essas coisas, Jesus olhou para o céu e disse: - Pai, chegou a hora. Revela a natureza divina do teu Filho a fim de que ele revele a tua natureza gloriosa.
2   Pois tens dado ao Filho autoridade sobre todos os seres humanos para que ele dê a vida eterna a todos os que lhe deste.
3   E a vida eterna é esta: que eles conheçam a ti, que és o único Deus verdadeiro; e conheçam também Jesus Cristo, que enviaste ao mundo.
4   Eu revelei no mundo a tua natureza gloriosa, terminando assim o trabalho que me deste para fazer.
5   E agora, Pai, dá-me na tua presença a mesma grandeza divina que eu tinha contigo antes de o mundo existir.
6   - Eu mostrei quem tu és para aqueles que tiraste do mundo e me deste. Eles eram teus, e tu os deste para mim. Eles têm obedecido à tua mensagem
7   e agora sabem que tudo o que me tens dado vem de ti.
8   Pois eu lhes entreguei a mensagem que tu me deste, e eles a receberam, e ficaram sabendo que é verdade que eu vim de ti, e creram que tu me enviaste.
9   - Eu peço em favor deles. Não peço em favor do mundo, mas por aqueles que me deste, pois são teus.
10   Tudo o que é meu é teu, e tudo o que é teu é meu; e a minha natureza divina se revela por meio daqueles que me deste.
11   Agora estou indo para perto de ti. Eles continuam no mundo, mas eu não estou mais no mundo. Pai santo, pelo poder do teu nome, o nome que me deste, guarda-os para que sejam um, assim como tu e eu somos um.
12   Quando estava com eles no mundo, eu os guardava pelo poder do teu nome, o mesmo nome que me deste. Tomei conta deles; e nenhum se perdeu, a não ser aquele que já ia se perder para que se cumprisse o que as Escrituras Sagradas dizem.
13   E agora estou indo para perto de ti. Mas digo isso enquanto estou no mundo para que o coração deles fique cheio da minha alegria.
14   Eu lhes dei a tua mensagem, mas o mundo ficou com ódio deles porque eles não são do mundo, como eu também não sou.
15   Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno.
16   Assim como eu não sou do mundo, eles também não são.
17   Que eles sejam teus por meio da verdade; a tua mensagem é a verdade.
18   Assim como tu me enviaste ao mundo, eu também os enviei.
19   Em favor deles eu me entrego completamente a ti. Faço isso para que, de fato, eles também sejam completamente teus.
20   - Não peço somente por eles, mas também em favor das pessoas que vão crer em mim por meio da mensagem deles.
21   E peço que todos sejam um. E assim como tu, meu Pai, estás unido comigo, e eu estou unido contigo, que todos os que crerem também estejam unidos a nós para que o mundo creia que tu me enviaste.
22   A natureza divina que tu me deste eu reparti com eles a fim de que possam ser um, assim como tu e eu somos um.
23   Eu estou unido com eles, e tu estás unido comigo, para que eles sejam completamente unidos, a fim de que o mundo saiba que me enviaste e que amas os meus seguidores como também me amas.
24   - Pai, quero que, onde eu estiver, aqueles que me deste estejam comigo a fim de que vejam a minha natureza divina, que tu me deste; pois me amaste antes da criação do mundo.
25   Pai justo, o mundo não te conhece, mas eu te conheço; e aqueles que me deste sabem que tu me enviaste.
26   Eu fiz com que eles te conheçam e continuarei a fazer isso para que o amor que tens por mim esteja neles e para que eu também esteja unido com eles.

A oração na prática cotidiana


Se restringirmos a observação acerca da prática da oração ao que é observado nas igrejas evangélicas brasileiras hoje, podemos afirmar que essas comunidades de fé tornaram-se algo como um imenso balcão de negócios que, de alguma forma, tenta operar entre o Céu e a Terra.



De um lado, temos os fiéis, pessoas comuns, na maior parte do tempo afligidas por algum tipo de dificuldade da vida, seja ela no campo financeiro, no campo emocional ou atingidos em sua saúde física. Do outro lado do balcão, temos os pastores, "bispos" e "apóstolos", negociando a concessão da benção divina à essas pessoas. 


E este é justamente o problema acerca da prática da oração: nós a vemos como uma força que pode mover o braço de Deus que, se seguirmos o princípio lógico, antes de nossa oração, ou da "oração forte" dos "314 pastores" ou do número de pastores determinado por cada igreja, estava, no mínimo, indeciso sobre nos oferecer a resposta positiva à nossa súplica.

A questão é: se entedemos a oração como uma força que move um Deus antes indisposto, temos, necessariamente, de jogar fora o conceito da Graça, conceito sem o qual, é impossível, por exemplo, entender todos os escritos do apóstolo Paulo.


A noção de que é possível convencer Deus, por meio de orações, acerca da justiça de nossas pequenas e, muitas vezes, egoístas petições individuais, contraria todo o Novo Testamento e, ainda mais grave, vai contra o próprio ensino de Jesus acerca da oração e da natureza de Deus. 

E isso é grave porque essa contradição é vivida diariamente por pessoas que se julgam e se afirmam como cristãs, mas estão afastadas do Evangelho (aqui, a palavra "Evangelho" pode ser lida como um sinônimo para o ensino de Jesus).


O resultado prático dessa contradição, que é a maciça migração de fiéis entre as igrejas e  o aumento de pessoas decepcionadas com a religião e com Deus,  fruto da irresponsabilidade de muitos líderes religiosos, e, infelizmente, de sua ganância, uma vez que a concessão da benção é sustentada pelo binômio oração-dízimo/contribuição financeira, já vem sendo sentido pelas igrejas evangélicas brasileiras há alguns anos e, provavelmente, tenderá a aumentar no futuro.  

A chave para entender essa contradição é a noção de que nem todas as orações são respondidas da forma como desejamos, e que isso não depende da fé do indivíduo ou dos atos de bondade e caridade que uma pessoa possa vir a fazer. 

Nesse caso, o que sobra? Se nem todas as orações são respondidas favoravelmente e se meus atos não determinam a resposta às minhas petições apresentadas a Deus, qual deve ser a esperança da pessoa que crê?


Acredito que a resposta, no caso dos cristãos, deva ser a confiança e o compromisso com o ensino do Evangelho. 


Paz e Bem!


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